Conferência do Governador Germano Rigotto na Federasul
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UMA ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO EM MARCHA PALÁCIO DO COMÉRCIO, 10/03/2004. Sinto-me distinguido pelo convite que me fazem para falar a este público tão significativo ao ambiente social e econômico de nosso Estado, plenário de ricos debates sobre nossa atualidade e nossa realidade. E é exatamente falando sobre realismo que quero iniciar esta conferência, meu caro presidente Paulo Feijó, porque o realismo é algo que aqueles a quem cabe organizar os fatores da produção, e aqueles a quem cabe governar, compartilham estreitamente. Empresários e políticos precisam ser realistas. Tinha inteira razão quem disse que o pessimista se queixa do vento, o otimista confia em que ele logo vai mudar, e o realista trata de ajeitar as velas. Pois nós somos aqueles que devem ajeitar as velas. Empreender e governar são tarefas distantes das utopias. Na última sexta-feira, ao participar do lançamento da pedra fundamental da unidade da Schincariol em Igrejinha, eu afirmei que investir em nosso estado não é um risco. Risco é não investir no Rio Grande do Sul. Fiz essa afirmação com os dois pés firmes no solo da realidade de um estado que está crescendo pela simples razão de que tem tudo para crescer. Os senhores e as senhoras sabem, tão bem quanto eu, a importância do fator humano numa organização. Pois bem, nosso estado tem o melhor Índice de Desenvolvimento Humano de todo o país, resultado de uma boa infra-estrutura educacional, de uma atuação na área da saúde pública que nos produz inidicadores superiores aos dos demais estados, e de uma cultura social e política que valoriza o trabalho, a ordem e o progresso. Os senhores e as senhoras sabem, tão bem quanto eu, também, o significado, dentro de uma organização, do amor próprio e da estima que seus colaboradores tenham por ela para enfrentar dificuldades. Pois bem, nós os gaúchos, temos elevada auto-estima e nos mobilizamos intensamente em torno do bem de nosso estado. Temos água doce em quantidades consideradas inexcedíveis por qualquer outra região civilizada do planeta; temos energia em incomparável variedade de fontes e nos aprontamos para, dentro de poucos anos, nos tornarmos exportadores desse importante insumo do desenvolvimento; temos comunicações, transporte e portos, numa posição geográfica privilegiada - esquina do Mercosul e coração do Cone Sul. Nosso agronegócio, pela tecnologia aplicada, pela mecanização, pela qualidade sanitária e fitossanitária de nossos itens produtivos - nesta pequena porção do território brasileiro, com 3% de seu solo - ponteia a produção nacional. Nossa diversificada indústria de transformação é a segunda do país e seus padrões de qualidade nos inserem de modo crescente no mercado internacional. Senhores e senhoras. Se não estou sendo pessimista (porque não tenho razões para ser), tampouco estou sendo otimista. Estou sendo absolutamente realista e afirmando que há vento nas velas. E que a velocidade com que avançarmos vai depender do modo como as ajeitarmos. É nesse sentido que estamos trabalhando, desde antes de assumirmos o governo. Muitas vezes, ao longo deste meses, tenho ouvido advertências no sentido de que eu deveria propagar as dificuldades com que recebemos o erário e a gravidade da crise fiscal que enfrentamos no âmbito do governo. Estou convencido de que aquilo que fiz, na minha comunicação com a sociedade, atendeu corretamente ao interesse público: a) reiteradamente anunciei o montante da dívida de curto e médio prazo no valor de 4,5 bilhões de reais; b) expliquei como se compunham essas parcelas; c) expus, com clareza, o déficit orçamentário cristalizado no orçamento de 2003; d) esclareci a sociedade sobre as dificuldades que teríamos pela frente. Mas fiz tudo isso de modo substantivo, sem adjetivos, ódios nem rancores, sem caçar bruxas nem fantasmas. Cuidei, usando o tom adequado, de que os problemas do Erário não afastassem investidores em prejuízo das estratégias de desenvolvimento que púnhamos em marcha para o Estado. Sempre esteve muito claro para nós que a crise fiscal não se confunde com nossas potencialidades e não podem inibir o ritmo que estamos imprimindo ao desenvolvimento do Rio Grande, porque o desenvolvimento ajudará a resolver a crise. O senhores e as senhoras sabem que é assim. As dificuldades do erário só terão solução saudável e definitiva através de um crescente e constante aumento da riqueza que gerarmos no Rio Grande do Sul. Nela está a saída para as carências das finanças públicas, esgotadas as alternativas anteriormente empregadas: inflação, endividamento, venda de ativos e caixa-único. Agora, só nos resta o melhor caminho: o caminho da produção, da produtividade, da austeridade na gestão, das parcerias, da abertura de novos mercados para nossos produtos. É rigorosamente o que vimos fazendo. Valendo-nos das potencialidades de nosso setor produtivo, passamos a agir, estrategicamente, no sentido de ampliar nossas vendas ao exterior, porque isso é bom para nossas empresas, para nossa renda e consumo internos, para nosso mercado de trabalho, para o comércio estadual, para o Rio Grande e para o Brasil. Somos o maior exportador per capita do país. Para que se tenha uma idéia da proporção em que isso se verifica, a exportação brasileira per capita é de 390 dólares; a exportação paulista é de 555 dólares. E a exportação per capita do Rio Grande é de 722 dólares. O saldo da nossa balança comercial (US$ 3,5 bi) é quase o dobro do saldo da balança comercial paulista (US$ 2 bi); Costumo dizer que é exatamente onde as coisas vão bem que elas podem melhorar ainda mais. Por isso todo o esforço da nossa SEDAI com seus programas e subprogramas de Informações e oportunidades de negócios; Apoio a feiras e missões comerciais; Inteligência setorial e mercadológica; Cooperação e capacitação empresarial para exportação, o SISCOMEX, bem como a criação da Sala do Exportador e do Portal do Exportador. Fechamos o ano com um crescimento de quase 28,5% nas exportações rio-grandenses para um total de quase duzentos destinos internacionais. Oitenta por cento desses países ampliaram, em 2003, suas compras no Rio Grande do Sul. E abrimos janeiro de 2004 com um aumento de 35% nas nossas exportações sobre janeiro de 2003. Ao mesmo tempo, estamos atuando no sentido de estimular os investimentos privados internos e de atrair investimentos produtivos externos. Com os contatos que mantivemos desde antes de assumirmos o governo, asseguramos, em 2003, novos investimentos pequenos, médios e grandes que envolvem 72 empresas e aplicações de 10,5 bilhões de reais. E mantemos negociações relacionadas com outros 92 empreendimentos cujos montantes envolvem mais 14 bilhões de reais. São dezenas de milhares de novas oportunidades de trabalho, que se agregam àquilo que seria gerado pelo crescimento normal da economia se tais ações não tivessem sido desenvolvidas. Para que isso acontecesse, foi necessário um trabalho um incessante e organizado do governo, uma estratégia de abertura a novos horizontes comerciais, de respeito aos contratos, de credibilidade. E eu, diria, especialmente, uma visão de futuro. Não estamos plantado para colher agora, mas em futuro próximo. E fizemos isso sem perda de receita - não perdemos um centavo de receita! O Fundopem, que alguns pretendem colocar no banco dos réus da evasão fiscal, é um notável instrumento, usado por todos os governos, com excelentes resultados. Não se perde receitas provenientes de investimentos que não se teriam. Além disso, das dezenas de projetos consolidados até este momento, apenas oito ingressaram nesse programa. E mesmo em tais casos, há ganhos imediatos, com o ingresso de capitais externos ou com a ampliação dos investimentos internos, na geração de postos de trabalho, de renda, de compras no mercado interno, que dinamizam a economia e por essa via acabam gerando tributos municipais, estaduais e federais. Comparem nossos números com os de outros estados, que não só não atraíram tantos investimentos como perderam empresas neles instalados. A realidade do Rio Grande é bem outra. Nós estamos fazendo nossa parte, olhos postos no futuro de nosso estado. No quadriênio anterior, o crescimento do PIB estadual foi de 12%. Somente em 2003, conseguimos realizar quase 40% desse valor, crescendo 4,7% num ano em que a economia nacional encolheu 0,2%. Mas o governo enfrenta dificuldades estruturais nas contas públicas. Diferentemente das organizações privadas, é impossível ao Estado, dada a natureza dos serviços que presta, expandir-se ou encolher-se ao sabor dos ritmos da economia e dos mercados. O Estado não pode ensinar a menos alunos nem reduzir sua atenção à saúde e segurança públicas. E note-se que ao mencionar essas três atividades essenciais, estamos contabilizando 94% do quadro funcional do estado. De outra parte, as demandas que recaem sobre o poder público, ao contrário do que acontece no mercado, não cessam de crescer num ritmo que, inclusive, se acelera em períodos de desenvolvimento econômico insuficiente. Assim, por exemplo, quando os salários perdem poder de compra, e isso vem acontecendo no país como um todo, mais e mais alunos fluem do ensino particular para o ensino público, como aconteceu no ano passado, com uma demanda adicional que chegou a cerca de cem mil vagas na rede estadual. *** Para enfrentar as dificuldades nas contas públicas se requerem medidas estruturais. Boa parte delas poderiam ser equacionadas por uma correta reforma tributária, pela qual tanto me bati. Nosso país perdeu no ano passado extraordinária oportunidade de a promover. Queríamos uma reforma que enfrentasse a sonegação, a elisão fiscal e a informalidade, mas tudo isso acabou sendo postergado em favor de remendos que resolveram as urgências da União, ampliando a carga tributária que incide sobre a sociedade, sem redistribuir receitas, sem a indispensável unificação do ICMS e atropelando o pacto federativo. Haverá exemplo melhor do que o COFINS? Eliminou-se a cumulatividade e, no contrapelo, ampliou-se descomunalmente a alíquota de uma obrigação fiscal que não é compartilhada pelos Estados. Mais dia menos dia isso vai mudar. Mas a concentração de recursos na União empobrece os erários estaduais, impondo-lhes dificuldades financeiras que precisam ser enfrentadas com realismo. Assim, estamos atuando, com tesoura afiada, no corte de despesas, eliminando injustiças, irracionalidades e desperdícios. Em convênio com o PGQP estamos promovendo a modernização da máquina administrativa, incorporando novas tecnologias. Buscamos a parceria do Banco Mundial para o desenvolvimento desse indispensável e urgente trabalho. Temos a convicção de que governar bem é arrecadar com justiça e racionalidade, e gastar com probidade, eficácia e nas mais corretas prioridades da sociedade. *** No ano de 2003, a disponibilidade líquida do Tesouro do Estado ficou um pouco acima de oito bilhões de reais e o déficit do Tesouro ficou em 650 milhões. Ao mesmo tempo, o vazamento das receitas por perdas da Lei Kandir e IPI-Exportação, somado com as remessas para amortização da dívida com a União, chegou a 2,5 bilhões de reais! A duras penas, conseguimos investir 5,9% da nossa receita enquanto quase uma terça parte dela nos escapa pelos dutos que apontamos. Portanto, independentemente do corte de despesas, que estamos fazendo, repito, com determinação, e dos esforços na área da arrecadação, o Rio Grande do Sul precisa repactuar as parcelas da dívida para com a União, e, junto com os demais estados exportadores, obter a ampliação das indenizações decorrentes de nossa perda de receita nas vendas ao exterior. Notem bem a natureza deste problema que agrava ainda mais a situação: quando a indústria rio-grandense exporta produtos acabados que incluem insumos adquiridos em outros estados, o erário padece duplamente. De uma parte, deixa de receber o tributo estadual correspondente. E de outra parte, se obriga a recolher a outros estados os créditos fiscais relativos ao valor do ICMS neles embutidos. Nesse caso, ficamos sem a receita e ainda pagamos sobre o que exportamos. *** Senhores e senhoras. Quando falamos de graves problemas estruturais, é destas coisas que falamos, num estado que produz, com sobras, os recursos fiscais necessários para bem atender as demandas sociais. Estas são as questões estruturais: a dívida que aumenta a enormemente a despesa e a falta de devida indenização pela isenção fiscal das exportações, que diminui terrivelmente a receita. Mas além disso, temos significativos créditos junto à União, pendentes de liquidação. É bom que se repita: tais créditos, entre os quais os créditos previdenciários e os relativos à indenização de investimentos que fizemos em propriedades ou empreendimentos federais, não são socorro nem favor. Como não será socorro, favor ou generosidade, a devolução do que já foi pago em ressarcimento ao crédito concedido pela União ao Banrisul no PROES. Esses valores não teriam sido desembolsados se não tivessem sido injustamente excluídos do limite máximo de 13% da receita líquida constante do acordo firmado em 1998. São direitos nossos que, gradualmente, estão sendo reconhecidos pelo governo federal. E estamos, mais do que ninguém, em nome do interesse dos gaúchos, empenhados em os reaver. *** Cabem aqui alguns esclarecimentos, para desfazer certa desinformação que paira no ar. Primeiro: a recuperação de nossos créditos junto à União constitui medida paliativa. Somados e liquidados, resolvem provisoriamente os problemas de caixa mas não constituem solução para o problema estrutural. Segundo: Os aumentos concedidos aos servidores dos poderes Judiciário e Legislativo são decorrentes de decisão unilateral e autônoma desses mesmos poderes. O governador está constitucionalmente impedido de os recusar (a Constituição de 1988 estabeleceu a autonomia orçamentária dos poderes), como ficou bem demonstrado anteriormente quando esse procedimento foi tentado. O veto caiu no STF e o Estado obrigou-se a pagar integralmente as obrigações que lhe estavam impostas. Terceiro: O Fundopem e o Integrar/RS (que inclui um benefício adicional se o município de instalação da empresa for de escasso desenvolvimento econômico) têm se constituído em importantes instrumentos para nossas políticas de desenvolvimento. A afirmação de que por essa via se perde receita é uma falácia. Quarto: Ao assumirmos o governo, convertemos o Fundopem, que operava com cinco anos de carência e oito para pagar, sem juros nem correção, num sistema com correção plena e juros, sobre o ICMS devido a partir do início da produção, com um máximo de 75% de abatimento do tributo. Ou seja, não sai um centavo, e ainda aumenta-se a receita atual e a futura. Tais instrumentos se situam acima dos imediatismos fiscais, mas bem dentro do realismo social e econômico. Atraem e redirecionam investimentos para regiões mais carentes, geram empregos, tributos, renda, dão vitalidade à economia e não significam perda de receita, porque é impossível perder o que não se tem nem se teria. De 133 solicitações em carteira aprovamos, até agora, apenas oito. Quinto: Nossos programas de refinanciamento dos créditos fiscais - REFAZ I e II - tampouco constituem uma política de renúncia fiscal. Bem ao contrário, são um instrumento de recuperação de débitos, que beneficiou o Estado, regularizou a situação de milhares de empresas de todos os portes e as incorporou, novamente à formalidade e à pontualidade para com suas obrigações fiscais. Sem o REFAZ I e II, nossas dificuldades financeiras teriam sido ainda maiores, na medida em que ambos agregam novas receitas mensais. *** Resumindo. Nossa equipe vem atuando, com vigor em todas as frentes possíveis, de modo infatigável, com criatividade, entusiasmo e irrenunciáveis padrões de conduta. Apregoamos dos telhados os valores da nossa gente e da nossa terra. Contamos com o apoio de nossos partidos da base do governo e de suas valorosas bancadas na Assembléia Legislativa. Olhos postos no futuro, atraímos investimentos, desenvolvemos políticas públicas convergentes à ampliação das nossas exportações. Tomamos, com determinação, decisões de uma economia de guerra que demandam cortes de gastos. Colocamos em marcha um programa de modernização do Estado. Buscamos ampliar as receitas, cobrar nossos créditos junto à União. Abrimos o estado para a formação de parcerias. Recuperamos nossa imagem interna e externa. Compusemos um ambiente político que favorece a unidade de esforços pelo bem do Rio Grande. Nada se oculta sob o tapetes da gestão pública, que conduzimos com transparência, com diálogo e com esse vigor, que herdamos da história e nos impulsiona para o futuro. Assim, acredito que estamos fazendo tudo que vislumbramos ao nosso alcance, mas não somos de toda verdade, a crise financeira do Estado exige as participação de todos os segmentos que o integram. Por isso, dentro de breves dias estarei constituindo o Conselho Estadual de Desenvolvimento Econômico e Social, conforme projeto de lei estadual que encaminhei à Assembléia Legislativa e nela obteve aprovação. Esse alto colegiado será constituído pelas principais instituições representativas da sociedade rio-grandense, incluindo trabalhadores, empregadores, servidores, Poder Legislativo, Poder Judiciário. Sua primeira tarefa - e a representação desta Casa ali estará presente - será a de se debruçar sobre a natureza dos problemas que acabei de apontar com o intuito de contribuir, com sua experiência e inteligência, para o encaminhamento das soluções em cujo rumo estamos atuando, bem como noutras direções que possam ser discernidas pela contribuição de cada um e de todos. A razão de minha presença hoje nesta Casa é a de lhes falar sobre a estratégia de desenvolvimento em marcha. Esta estratégia sim está em marcha. Os problemas estruturais do Estado não inibiram nossa ação para atrair investimentos e promover seu desenvolvimento. Mas a par do desenvolvimento precisamos resolver os problemas fiscais que inibem a justa e necessária ação do Estado no atendimento de suas atribuições específicas. Para isso, precisamos, superando divisões ideológicas e tudo aquilo que possa inibir nossa unidade pelo bem do Rio Grande, nos congregarmos em favor do Estado para que ele seja de fato um Estado que trabalha unido. Muito obrigado!