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Democracia com respeito

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Por Eduardo Leite

Entre as virtudes de uma democracia saudável, está o potencial que o sistema embute de conciliação entre diferenças e opostos. Tendo como ponto de partida a disputa pública de ideias e ações, o jogo democrático oferece a oportunidade de negociação e composição permanentes, além da possibilidade de agir, responsavelmente, em benefício da totalidade dos representados depois de encerradas as fases legítimas e produtivas de embate. Claro que esse potencial não é automático: requer maturidade e esclarecimento constantes.

Vivo essa situação privilegiada e desafiadora como governador do Rio Grande do Sul e posso garantir: tenho aprendido muito. O cargo que exerço, por conta da generosidade da democracia, cobra uma enorme predisposição ao entendimento. Mesmo que julgue ter me preparado para atuar politicamente, administrar o Rio Grande do Sul multiplica a exigência por negociação, ainda mais quando se governa com o intuito de transformar um Estado fragilizado por percalços fiscais crônicos.

Agentes públicos precisam desenvolver essa habilidade de ouvir e ceder, sobretudo em um ambiente político e social ideologicamente radicalizado. Diante da saturação e da irracionalidade com que grupos adversários disputam ideias e certezas, notadamente nos ambientes digitais que se tornam até mesmo hostis, é indispensável que os detentores de mandato ajam com responsabilidade e sobriedade. A sociedade precisa de bombeiros, não de incendiários.

Estes tempos obscuros e obtusos, em alguns aspectos, que estamos vivendo trituram padrões mínimos de convivência e tolerância. Creio que mergulhamos em uma era que atropela sutilezas que são verdadeiras conquistas da humanidade. De todas as que têm sido atingidas pela falta de sensibilidade, aponto principalmente o direito às diferenças de opinião e às diversidades de toda ordem. Não há dia em que não assistamos ao ataque a direitos humanos fundamentais, um legado coletivo que deve ser preservado a tudo custo.

Todo ato de preconceito é um atentado à dignidade humana. Todo desrespeito à memória e à história é um gesto violento contra as lutas individuais e coletivas. Toda agressão a minorias, no fundo, é uma derrota da liberdade das maiorias. Quando vemos, sem reagir ou sem nos indignarmos, o avanço do desprezo às identidades ou o aumento do desrespeito ao outro, admitimos o nosso fracasso como seres humanos integrais. Falhamos – e não podemos falhar.

Entre tantos compromissos, a classe política também precisa oferecer respostas saudáveis neste campo do convívio humano. Reproduzir preconceitos e alimentar ódios e incompreensões é desvirtuar o sentido público dos cargos que exercemos. O papel contemporâneo do agente público é o de contemporizar, o de apaziguar os ânimos, o de buscar soluções ponderadas, sensatas e negociadas. Não há respaldo nos princípios civilizatórios da democracia ficar alimentando uma disputa ensandecida em torno de posições ideológicas cristalizadas.

Defendo a necessidade, inclusive, de adaptarmos nossas posições político-partidárias, para apresentarmos à sociedade plataformas conceituais e dogmáticas que de alguma maneira dissipem a polarização ideológica e acolham caminhos conciliatórios e sintonizados com os desafios do nosso tempo. Os partidos devem materializar preocupações contemporâneas com a dignidade dos grupos humanos, sem barreiras ou distinção de cor, sexo, idade e nacionalidade, o que pode ajudar a resgatar a representatividade dos nossos partidos.

A democracia deveria ser o sistema de empatia. Deveria estimular que todos os envolvidos no jogo democrático aceitassem o que se desconhece, respeitassem o que assusta em um primeiro momento. Quando penso nas virtudes da democracia sempre imagino que, com o tempo, ela vai aprimorar a capacidade de todos se colocarem no lugar do outro. E quando isso acontecer, creio que a própria percepção sobre o valor da democracia estará consolidada.

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