Ativistas debatem novo paradigma para a economia no Congresso Brasileiro de Agroecologia
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O debate sobre o tema É possível pensar em mudança paradigmática na economia? ocorreu na manhã desta quarta-feira (27), no auditório principal do VIII Congresso Brasileiro de Agroecologia, que ocorre durante toda esta semana na PUCRS, em Porto Alegre, com apoio da Emater/RS-Ascar. Os palestrantes foram o economista, ativista social e integrante da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), João Pedro Stédile, o pesquisador Alan Boccato, e o ativista do movimento social espanhol Ecologistas em Accion, Tom Kucharz.
Boccato falou das consequências do paradigma do crescimento ilimitado da economia. De acordo com ele, esse sistema levou a sociedade a estar presa em uma gaiola de consumo, que limita as liberdades individuais, prega a competitividade e a exclusão e se torna impraticável a curto e longo prazo devido às desigualdades sociais intrínsecas deste paradigma e aos danos ambientais que gera.
O dilema da sociedade atual é que crescer gera crise social e ambiental, mas decrescer também gera instabilidade. Então a proposta é de que todo esse sistema tem de ser superado. O primeiro passo é entender que nem todos serão ricos e que devemos buscar uma ética universal, que permita que todos tenham boas condições de vida, explicou.
O palestrante também frisou a necessidade de reconquista da autonomia da população, que neste momento está presa em condições técnico-burocráticas advindas do sistema, e, principalmente, superar o que chamou de coisificação da vida, quando as necessidades básicas da população, como, por exemplo, a de mobilidade, são transformadas em necessidades de ter coisas, neste caso, um carro.
A autonomia política da sociedade, em que os próprios cidadãos devem tomar as decisões, também precisa ser buscada. Além disso, o conceito de simplicidade deve estar presente, as pessoas poderiam despender menos tempo com trabalho assalariado e depender menos do consumismo, para que consigam estar mais presentes em seus relacionamentos, como o cuidado com os filhos, e também no debate político, ressaltou.
Ele esclareceu que este novo paradigma não deve ser imposto, mas praticado naturalmente pela qualidade de vida que gera. Segundo ele, a agroecologia se encaixa neste novo paradigma porque, de acordo com as discussões mais recentes sobre o tema, prega uma construção social de baixo para cima, ou seja, dos camponeses (produtores de alimentos saudáveis), para o restante das estruturas sociais, através de processos participativos, democráticos e de distribuição igualitária de renda.
Também geraria uma desmercantilização, já que os conceitos agroecológicos falam da autoprodução de alimentos, desestimulando o uso de agrotóxicos, mas utilizando um sistema multidiverso, muito diferente da uniformização produtiva dos tempos atuais. Essa mudança já está em curso, mas ainda é bastante marginal, completou.
A vida no centro do sistema
Tom Kucharz iniciou sua reflexão lembrando as vítimas do atual sistema capitalista e do agronegócio. Citou a morte de centenas de filipinos como consequência de desastres ambientais, os camponeses da palestina, que são proibidos de produzir na Faixa de Gaza, e os camponeses haitianos que, devido a ocupação de seu território por militares da América Latina, também têm sua liberdade tolhida.
Ele também pregou a necessidade de um novo modelo, não somente de transição, mas que seja capaz de desintegrar o capitalismo patriarcal e que coloque a própria vida no centro do sistema. A lógica dos benefícios econômicos se choca com a vida, explica.
Kucharz focou seu discurso na luta por uma produção solidária, sem desperdício, descentralizada, desmercantilizada, sem hierarquias, plural e igualitária. Também comentou a necessidade de acabar com o sistema bancário e criar uma moeda com âncora em recursos físicos, como os minerais. Colocou como urgente a implantação de novos modelos energéticos, com controle das próprias comunidades.
Mobilização das massas
João Pedro Stédile fez um breve relato sobre o atual sistema capitalista. Falou sobre aspectos do capitalismo industrial e sobre o capitalismo financeiro - iniciado na década de 1990 e que predomina até hoje. Este sistema impôs uma nova divisão de trabalho e a homogeneização da produção, principalmente através dos sistemas de commodities. Atualmente, no Brasil, se formos pensar na lógica deste sistema, poderíamos apenas produzir grãos, cana-de-açúcar e eucalipto. Esta é a demanda das empresas que atualmente controlam todo o comércio mundial da produção agrícola, disse.
De acordo com o ativista, é muito grave para a humanidade que estas empresas controlem a propriedade e as sementes. O capital financeiro, com os créditos de financiamento, acaba dominando os processos. A classe dominante no campo são os grandes fazendeiros, os bancos e as empresas multinacionais que fornecem as máquinas, as sementes, os agrotóxicos e, depois, compram os grãos. A mídia burguesa é uma grande colaboradora desse processo porque legitima ideologicamente este sistema, observou.
Ele também destacou que, na questão produtiva, a agroecologia é a saída ideal do capitalismo atual. É um modelo de agricultura para as massas, com novas matrizes de produção inclusivas, completou.
Para concluir, Stédile comentou que a única saída deste sistema exclusivo é a mobilização das massas e que as próprias contradições existentes no capitalismo também vão acabar minando este sistema. Tudo no capitalismo tem contradição, uma delas é a destruição da biodiversidade, que, consequentemente, vai trazer queda na produção e uma série de intempéries climáticas. É necessário uma mobilização de massas para que as mudanças ocorram.
Texto: Gabriela Miranda
Foto: Assessoria Emater/RS-Ascar
Edição: Redação Secom (51) 3210.4305