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Especialistas apontam papel decisivo da imprensa antes e durante o golpe de 1964

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PORTO ALEGRE, RS, BRASIL, 03.04.14: Painel: De Jango ao Golpe, que integra a programação da Semana da Democracia. Com a fala, o secretário executivo do Cdes-RS, Marcelo Danéris. Foto Alina Souza/ Palácio Piratini
Semana da Democracia - Foto: Alina Souza/Especial Palácio Piratini

O papel decisivo da imprensa durante o golpe de 1964, a necessidade de esclarecer fatos do período da ditadura e a importância do processo de redemocratização do país marcaram as discussões entre especialistas do painel "De Jango ao Golpe". Realizada nesta sexta-feira (4), no Memorial do RS, na Capital, a atividade - que integra a Semana da Democracia - reuniu jornalistas, políticos e representante da Comissão Nacional da Verdade. Com divergências pontuais, os convidados foram unânimes ao condenar o Estado de exceção durante 21 anos e exigir a revisão da Lei da Anistia.

Um dos palestrantes do dia, o jornalista Juremir Machado da Silva criticou o papel decisivo de grande parte da imprensa e disse que os meios de comunicação serviram para legitimar o que classificou de golpe midiático civil-militar contra João Goulart. "A imprensa brasileira apoiou o golpe e a maioria apoiou também a ditadura. Houve divergências em relação à censura, mas quanto à política econômica do golpe, quanto ao fato de que o golpe seria a restauração da democracia, tudo isso a nossa imprensa infelizmente avalizou", afirmou.

Neto do presidente João Goulart, Christopher Goulart destacou a importância do debate e a necessidade de fazer um ajuste na história daquele período. Além de defender a revisão da Lei da Anistia, Christopher afirmou que o principal legado de seu avô, as reformas de base, foram colocadas de lado por muito tempo. "Passamos 21 anos de repressão e mentiras em relação ao legado democrático das reformas de base. Eventos como esse refletem uma proposta de governo, uma linha democrática, calcada no questionamento de estruturas e instituições, que por muito tempo foi jogado ao limbo".  

Anistia
Sobre a revisão da Lei de Anistia, Christopher ressaltou que é uma questão de justiça: "Precisamos fazer ajuste na história, revisar a Lei da Anistia, não por uma questão de revanchismo ou de ódio, mas porque há uma necessidade em cima dos preceitos da justiça de transição de que a nossa história faça um ajuste. Porque não há como progredirmos nesse sentido na questão de direitos humanos quando se deixam impunes torturadores e assassinos que assumem como matavam e torturavam. É um desrespeito contra a cidadania".

Comissão
Integrante da Comissão Nacional da Verdade, a advogada Nadine Borges criticou a 'herança' de uma polícia militarizada ainda nos dias atuais e ressaltou os prejuízos causados à população brasileira durante o Estado de exceção. "O regime militar impediu o desenvolvimento econômico e social do país. Não tenho dúvidas disso, e o exemplo é que as pessoas sonhavam em ter um salário mínimo de 100 dólares. E isso não foi possível". 

Nadine também destacou que a discussão sobre o tema deixa um legado importante à sociedade: "A única forma de a gente mudar isso na nossa família, no ambiente de trabalho, é reconhecer os erros, saber onde as coisas não deram certo para fazer diferente. Esses 50 anos do golpe militar tem nos ensinado: hoje os jovens estão aprendendo com isso".

União de forças
Representante das forças de oposição ao regime, o senador Pedro Simon disse que Jango teve a coragem de levar, à época, o tema das reformas de base para um grande debate. "Este debate serve para reaver a verdade, para não sumir da nossa história. A sociedade está sabendo as coisas que aconteceram naquela época". 

Ao defender a atitude de Jango, que não resistiu à ação dos militares, Simon garantiu que o presidente deposto evitou uma guerra civil. "O golpe de 64 foi a união de todas as forças reacionárias da igreja católica, da grande imprensa, do grande empresariado. Todos se uniram no sentido de derrubar um governo. Com os americanos atrás, conseguiriam que isso acontecesse". 

Professora de História da PUC - RJ, Maria Celina D'Araújo minimizou a participação americana e creditou a ação militar à crise econômica. Para Celina, o golpe teve origem em interesses econômicos e 'porque a elite brasileira quis'. "As reformas de base eram consideradas como parte de uma agenda comunista". 

Confira a programação da Semana da Democracia, iniciada em 01 abril:

Dias 04 a 05 de abril

Diálogos - ¨Do golpe a redemocratização: caminhos do Brasil¨

Local: Arena montada no Memorial do Rio Grande do Sul/ Museu dos Direitos Humanos do Mercosul, Praça da Alfândega.

14h – 17h – Painel: Ditadura, Democracia e Gênero.

Palestrantes:
Céli Regina Pinto – Professora de História na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Integra a Comissão Estadual da Verdade no RS. Desenvolve pesquisa na área de Ciência Política enfatizando temas como o feminismo.
Lilian Celiberti – Uruguaia, ativista dos Direitos Humanos, foi sequestrada junto com seus dois filhos em 1978 durante a Operação Condor.
Lícia Peres – Socióloga. Foi a primeira presidente do Movimento pela Anistia.
Soledad Muñoz – Abogada; Profesora de Derecho Internacional Público (Universidad Nacional de La Plata, UNLP); Miembra del Departamento de Derechos Humanos del Instituto de Relaciones Internacionales, (UNLP); Consultora externa del Instituto Interamericano de Derechos Humanos (IIDH).
Mediadora: Ariane Leitão – Secretária de Estado de Políticas para as Mulheres do RS.

18h – Apresentação de “Guri d’América”: Raul Elwanger

18h30 – 20h – Painel: Terrorismo de Estado

Palestrantes:
Rosa Roisinblit - Ativista argentina pelos direitos humanos e vice-presidente da Associação das Abuelas de Plaza de Mayo
Jimena Vicario - Neta de desaparecidos apropriados pelos militares argentinos
Franklin Martins – Jornalista. Atuou no movimento estudantil e fez parte do MR-8. Em 1969, fez parte da Ação Libertadora Nacional. Foi um dos mentores do sequestro do embaixador americano.
Mediador: Antônio Escostegy Castro – Advogado representante do Conselho Federal da OAB e Conselheiro do Cdes-RS.

Dia 05

10h – 12h – Painel: Ditadura, Resistência e Reparação.

Palestrantes:
Rodrigo Patto Sá Motta – Professor de História da Universidade Federal de Minas Gerais e atual Presidente da Associação Nacional de História (ANPUH)
Caroline Silveira Bauer – Historiadora, Professora de História da Universidade Federal de Pelotas e colunista da Revista Carta Maior. Seus estudos tem ênfase nas ditaduras latinoamericanas e temas correlatos.
Carlos Frederico Guazzelli - Advogado, presidente da Comissão da Verdade do RS
Mediador: Daniel Vieira Sebastiani – Professor de História, Diretor Nacional do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz e Conselheiro do Cdes-RS.

14h – 18h – Painel: Golpe, Ditadura e Movimentos Culturais.

Palestrantes:
Silvio Tendler – Documentarista e cineasta. Conhecido como o cineasta dos “vencidos”.
Luis Augusto Fischer – Escritor e Professor da UFRGS
Nei Lisboa – Músico. Irmão mais novo de Luiz Eurico Tejera Lisbôa, primeiro desaparecido político brasileiro cujo corpo pôde ser localizado, no final dos anos 70.
Nelson Coelho de Castro – Cantor e compositor, vivenciou o cenário musical da época através dos festivais universitários, das Rodas de Som de Carlinhos Hartlieb e de apresentações na noite porto-alegrense.
Edgar Vasquez - Ilustrador, artista gráfico e cartunista.
Mediador: Márcio Tavares – Coordenador do Memorial do RS

18h – Exibição do documentário de Sílvio Tendler

Serão lançados os documentários:

"Os militares que disseram NÃO" - sobre os militares cassados, produzido pelo Projeto Marcas da Memória da Comissão de Anistia e dirigido pelo Sílvio Tendler.
"Por uma questão de justiça: os advogados contra a ditadura", sobre os advogados dos presos políticos, produzido pelo Projeto Marcas da Memória da Comissão de Anistia e também dirigido pelo Sílvio Tendler.

Texto: Felipe Bornes Samuel 
Edição: Redação Secom (51) 3210.4305 

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