Evento celebra conclusão da recuperação da Casa de Cultura Mario Quintana e reabertura total da Cinemateca Paulo Amorim
Na ocasião, também foi inaugurada linha simbólica demarcando antiga margem do Guaíba
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Passados nove meses desde a cheia que atingiu Porto Alegre no ano passado, a Casa de Cultura Mario Quintana (CCMQ), instituição da Secretaria da Cultura (Sedac), realizou nesta quinta-feira (20/2) o evento “Memória das Águas”, que celebrou a recuperação integral da CCMQ e da Cinemateca Paulo Amorim. As obras receberam investimento total de R$ 3.474.156,45. Na oportunidade, foi inaugurada uma linha simbólica demarcando a antiga margem do Guaíba. Instalada na Travessa Rua dos Cataventos, a linha mostra o limite até onde as águas do lago chegavam antes de a área ser aterrada, no século XIX, trazendo uma reflexão sobre processos de urbanização e a relação entre civilização e natureza.
“Agradeço profundamente ao Banrisul, que é parceiro desde a inauguração da Casa e que, por meio do Programa Banrisul Reconstruir RS, aportou recursos imediatos no momento em que mais precisávamos. O montante contribuiu não apenas para recuperarmos a Cinemateca e os demais espaços da CCMQ atingidos pela enchente, como também para torná-los melhores do que eram antes”, destacou em seu discurso a secretária da Cultura, Beatriz Araujo. “Quero também fazer um reconhecimento à equipe vocacionada e apaixonada que trabalha na CCMQ e que, no dia a dia, faz da Casa um lugar tão especial e acolhedor”, salientou.
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“À época da enchente, afirmei que do lodo reconstruiríamos um Estado muito melhor. E, de fato, aqui está uma Casa de Cultura muito melhor, mais bonita e entregue recuperada ao povo gaúcho. Aqui estão a história e o futuro do Rio Grande. Que venham todos à Casa, pois ela é de todos os porto-alegrenses, gaúchos e brasileiros”, ressaltou o presidente do Banrisul, Fernando Lemos. Tanto a secretária quanto o presidente do banco emocionaram-se durante seus discursos.
O encontro marcou também a reabertura da Sala Norberto Lubisco, a única sala da Cinemateca Paulo Amorim – vinculada ao Instituto Estadual de Cinema (Iecine) – que permanecia em reforma após os danos causados pela inundação. Na ocasião, foi exibido o longa “Dias Perfeitos”, de Wim Wenders, um dos títulos em cartaz mais assistidos pelo público quando a enchente de maio começou.
Com a modernização, a sala agora conta com novas poltronas dispostas em patamares para melhorar a experiência do público, além de equipamentos de som e projeção renovados, reforço no isolamento acústico e recuperação completa da parte elétrica. O banheiro e o ambiente da recepção do espaço foram reformados e receberam nova pintura, um cuidado que também se estendeu à sala de projeção. Ainda, o sistema de ar-condicionado foi higienizado, e os carpetes do piso, escadas e paredes foram substituídos.
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Entre os R$ 3.474.156,45 investidos na CCMQ, o Programa Banrisul Reconstruir RS destinou R$ 2.779.156,45, compostos por R$ 350.624,83 exclusivamente para a Cinemateca Paulo Amorim e R$ 2.428.531,62 para a recuperação do restante da Casa. A Cinemateca também recebeu recursos de um edital da Lei Paulo Gustavo (LPG) apresentado pela prefeitura de Porto Alegre para auxílio às salas de cinema, no valor de R$ 245.000,00. Além disso, recebeu aporte de um convênio de R$ 450.000,00 entre a Sedac e o Ministério da Cultura (MinC), proveniente de emendas parlamentares do senador Luiz Carlos Heinze, do deputado Pompeo de Mattos e do ex-senador Lasier Martins. O total de investimentos na Cinemateca, considerando todas as fontes de recursos, foi de R$ 1.045.624,83.
“A reabertura é um momento de celebração da equipe e de todos os nossos frequentadores e amigos. Agora, temos nossas três salas em pleno funcionamento e poderemos ampliar a oferta de filmes, estreitando ainda mais os laços com o nosso público e com a comunidade cultural”, disse a coordenadora da Cinemateca, Mônica Kanitz.
A maquete tátil do edifício da CCMQ, voltada para pessoas com deficiência visual, danificada pela enchente, retornou como peça expositiva de memória na ala Oeste do prédio, protegida por uma estrutura de acrílico. A peça, inaugurada em setembro de 2023, passou por um cuidadoso processo de higienização feito pelo setor de restauração do Museu de Arte do Rio Grande do Sul (Margs) – também instituição da Sedac –, no qual se preservaram as marcas deixadas pela água, como um testemunho histórico. Paralelamente, uma nova maquete tátil já foi instalada na ala Leste e está disponível para uso do público.
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Em recuperação desde o dia 21 de maio – com drenagem, limpeza, pintura, reparos elétricos, de redes hidrossanitárias e outros –, a Casa encerrou a etapa de reconstrução e reabre todos os seus espaços, graças ao financiamento do Programa Banrisul Reconstruir RS, viabilizado por meio da Sedac.
Sobre a intervenção artística “Memória das águas”
Idealizada pela diretora da CCMQ, Germana Konrath, a linha simbólica, que marca a antiga margem do Guaíba, busca ilustrar que a cheia de 2024 não foi uma “invasão” da água, mas sim um retorno dela ao seu espaço original, antes da intervenção humana. Segundo ela, os aterros sucessivos, realizados na segunda metade do século XIX e ao longo do século XX, faziam parte de um movimento global, seguindo um modelo de urbanização. Porto Alegre, assim como Rio de Janeiro e outros municípios litorâneos e portuários, tanto brasileiros quanto estrangeiros, foram afetados por esse processo, no qual a expansão urbana nas frentes de água foi, muitas vezes, vista como uma forma de progresso.
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Germana destacou, entretanto, que a crítica ao modelo de aterro ganhou força especialmente a partir da metade do século XX, com a crescente conscientização sobre seus impactos ambientais. O evento meteorológico de 2024, que atingiu todo o Estado, é visto pela diretora como um reflexo do agravamento das mudanças climáticas – que têm se manifestado de maneira cada vez mais radical. O tema também foi discutido na série de encontros do evento Cultura no Antropoceno, realizado entre outubro e dezembro de 2024 na instituição.
Na Casa, o pós-enchente foi ressignificado como uma oportunidade para refletir e provocar um debate mais amplo sobre os desafios ambientais. “Quando pensamos nessa série de encontros a partir do conceito de antropoceno, tomamos partido no sentido de um espaço cultural em que opinião e ideias podem ser colocadas, debatidas, confrontadas, um espaço de trocas e intercâmbio de saberes, fomentando exercícios de futuro e imaginação, não apenas de resgate do passado”, afirmou Germana.
A linha “Memória das águas”, instalada permanentemente na Travessa Rua dos Cataventos, pretende estabelecer um contraponto à marcação da cota de inundação, acrescentada durante o ano passado à fachada do edifício, que chegou a mais de 1,5m de altura junto à rua Sete de Setembro. A diretora pontuou que esse ato expõe o contínuo avanço da cidade sobre o Guaíba no momento em que se discute o avanço das águas sobre a cidade. “A marcação é sutil, como um índice a resgatar os dados e limites territoriais da cidade, que os mapas históricos de Porto Alegre, que embasaram essa marcação, não nos deixam esquecer”, finalizou ela.
Texto: Ascom CCMQ
Edição: Camila Cargnelutti/Secom