Leia a íntegra da palestra do governador Rigotto na Federasul
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Palestra do Governador Germano Rigotto na Federasul, em 12 de março de 2003. O RIO GRANDE QUE QUEREMOS Estou muito feliz por retornar à casa da Federasul e voltar a esta tribuna, onde estive no ano passado para lhes apresentar, como candidato, meu programa de governo. A gentileza dos senhores e das senhoras me concede, agora, o privilégio de retornar, como governador, propondo-me um tema sob todos os aspectos cativante: O Rio Grande que queremos. Martin Luther King pronunciou certa feita um discurso que entrou para a lista das mais belas peças da oratória universal, no qual quase todas as frases iniciavam com as palavras I have a dream - Eu tenho um sonho. E ele, ao longo do discurso, descreveu de modo esplêndido esse sonho de uma América livre, justa, solidária e fraterna. Pois eis que os senhores e as senhoras me pedem para discorrer sobre o Rio Grande que queremos. E eu fico tentado, com menos talento, mas com iguais anseios, a lhes afirmar que sonho para o nosso estado os mesmos sonhos do grande líder norte-americano. Mas não é isso, por certo, o que de mim esperam neste momento. Desejar que todos tenham casa, comida, emprego, prosperidade, justiça, é uma coisa. E governar, outra. Governar, da mesma forma que administrar uma empresa, é lidar com a realidade. E a realidade tem colunas de receita e despesa, tem possibilidades e impossibilidades. Umas e outras levam à obrigação de dizer sim e ao dever de dizer não. Se eu lhes falasse de um sonho, de uma quimera, de um paraíso ao sul do rio Uruguai, talvez todos quiséssemos nos mudar para lá. Mas esse lugar não estaria disponível. Seria uma utopia. E eu suspeito das utopias exatamente por serem como são - tão sedutoras quanto inatingíveis. Por serem sedutoras, empolgam; por serem inatingíveis, têm feito, ao longo da história, que muitas atrocidades fossem cometidas em seu nome. Sabem os planejadores que uma boa maneira de alcançarmos um determinado cenário consiste em nos colocarmos na posição que queremos atingir e, a partir dessa posição, observarmos a realidade que temos. Em seqüência, definido o objetivo futuro e compreendida a realidade, estabelece-se o caminho a percorrer. Eu gosto desse processo porque ele me parece bem realista. No caso rio-grandense, ele simplifica muito as coisas. Contaram-me, recentemente, uma pequena história muito significativa. Um sábio, que viajava com seu discípulo pelo interior de seu país, chegou, certa feita, a uma pequena propriedade onde vivia uma família, em grande miséria. Eles tinham uma vaquinha magra da qual tiravam leite, faziam algum queijo e trocavam por víveres. O sábio pernoitou ali com seu discípulo e, ao amanhecer, antes que todos levantassem, ordenou-lhe que levasse a vaquinha a um morro e a lançasse num despenhadeiro. Relutante, o discípulo cumpriu o que lhe fora ordenado. No entanto, contrariado pela crueldade da ordem que recebera, se indispôs com o mestre, de quem se afastou. Movido pelo remorso, anos mais tarde, voltou ao local e encontrou tudo modificado, tratores, celeiros, uma casa nova, muita gente trabalhando. Procurou pelos proprietários e ficou sabendo que com o sumiço da vaca eles haviam buscado outras alternativas para sobreviver. E o resultado estava ali. Não lhes vou falar sobre dificuldades do Estado porque elas são bem conhecidas. O estado tende, sistematicamente, a gastar mais do que arrecada. Tem uma dívida vultosa. Ora foi financiado pela inflação, ora pela elevação da carga tributária, ora pela venda de ativos. Presentemente, os ativos não são mais significativos. A inflação (que como ensina Milton Friedman é a única forma de taxação que pode ser imposta sem legislação) destroçaria a economia nacional. E a carga tributária já jogou boa parte do país na informalidade. Como se vê, o tempo e a história nos colocaram frente à realidade: a vaca despencou. E quase nos levou junto. Portanto, quando eu me desloco para o cenário que quero e olho a realidade atual, felizmente só encontro um caminho. E digo felizmente porque esse caminho é o melhor caminho: trabalhar. Pois o governo vem trabalhando, simultaneamente, em três grandes frentes. A primeira frente denominamos Política de Paz: - o radicalismo já fez muito mal ao estado; - a paz não é uma terceira-via; ela não é nem mesmo um fim; ela é um meio indispensável para que possamos trabalhar bem; - pacificar o Rio Grande, desestimular as malquerenças, dialogar. Dialogar com a sociedade, com a base do governo e com a oposição, principalmente porque não guardo desafetos. A oposição cumpre um papel definido pelas urnas, indispensável à democracia. Mas eu sei que não teremos qualquer dificuldade de convivência nem divergências que não possamos contornar onde quer que esteja envolvido o bem do Rio Grande. Um romancista inglês que vem ganhando notoriedade nos meios intelectuais britânicos, Richard Armour, produziu uma frase que considero muito significativa para a nossa realidade. Ele disse assim: Por muitos anos me pareceu que a política tinha tudo a ver com direita e esquerda e nada a ver com certo e errado. Vamos combinar que o senhor Armour tem toda a razão... De fato, enquanto os conceitos ideológicos dividem e levam a tensões inúteis, resulta muito mais fácil e produtivo nos unirmos em torno daquilo que seja certo e contra aquilo que seja errado. O que queremos para o Rio Grande, queremos para o Brasil. Animados por esse espírito, mantemos uma relação extremamente produtiva e interativa com o governo federal. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um homem de bem, movido por nobres intenções e terá de nosso governo o apoio de que precisar para que o Brasil seja um país mais próspero, mais justo, mais equilibrado. Não há, no Risco Brasil, espaço para o risco do desentendimento entre aqueles que têm responsabilidades de estado. Temos que nos unir pelo que está certo e contra o que está errado. A segunda frente denominamos Economia de Guerra. Além da dívida consolidada com a União, superior a 22 bilhões de reais, recebemos o Rio Grande com uma dívida de 4,5 bilhões de reais. Nela se contabilizam débitos com hospitais, pequenos fornecedores, postos de combustível que abastecem as viaturas que fazem segurança pública, empreiteiros de serviços que não foram pagos, profissionais que atendem ao IPE, etc.. Ademais, o orçamento de 2003 subestima a despesa, inclusive com pessoal, e superestima a receita, prevendo investimentos irrealizáveis. Em vista disso, decidimos: - cortar despesas, reduzir cargos de confiança, rever convênios, renegociar contratos, diminuir o custeio geral em 300 milhões de reais no decorrer deste ano; - fazer isso de modo que envolva todo o governo e toda a administração, em todas as suas unidades de custo, preservando-se as funções prioritárias de segurança, saúde e educação; - não iniciar obras novas, exceto as de caráter emergencial; - atribuir prioridade as obras em fase final; - dar seqüência ao que estiver em andamento, em conformidade com as disponibilidades do Tesouro. Não poderíamos agir de modo diferente. Cortamos a gordura e a carne do governo. Precisamos economizar para podermos investir naquilo que é essencial ? educação, saúde e segurança ?, para executar obras de emergência e para concluir aquilo que está em fase final de execução. Assim, foi possível, em dois meses, pagar dívidas no montante de 118 milhões de reais e ampliarmos nossa atuação nos setores fundamentais do governo. Na área de Segurança Pública: - regularizamos as promoções da Brigada Militar, - aumentamos o policiamento preventivo e ostensivo, - nos empenhamos em concretizar medidas para normalizar a vida das instituições do setor, - começamos a enfrentar o déficit de pessoal, que chega a 10 mil na Brigada Militar e a mais de 2 mil na Polícia Civil, com o início do curso de formação de 1500 soldados, já aprovados em exame de seleção; - adiantamos entendimentos com o Ministério da Justiça e a Secretaria Nacional de Segurança Pública para firmar convênios destinados à renovação da frota, do armamento e para ampliação da nossa capacidade prisional; - nos dedicamos a recuperar a auto-estima dos policiais civis e militares; devolvemos à Brigada Militar seu antigo e histórico Quartel General; devolvemos à polícia civil o Palácio da Polícia; devolvemos o Colégio Tiradentes à Brigada Militar; - regularizamos o fornecimento de combustíveis às viaturas dedicadas às tarefas de policiamento. Há quem queira, por motivos ideológicos, confundir toda a necessária ação policial, preventiva e repressiva, com truculência e violência. Não! O governo e seus órgãos estão do lado da sociedade e ao lado dos homens e mulheres que têm o difícil e oneroso encargo de combater o crime. Cabe-lhes atuar nos limites da lei, em defesa da lei, da sociedade e da ordem pública. E com a ordem pública não se brinca impunemente. Não queremos uma polícia truculenta, nem violenta, nem lenta, mas firme, atuante, presente, eficaz e eficiente. Técnica e competente. Na área da Educação: - iniciamos, junto com o Ministério da Educação, um trabalho destinado a erradicar o analfabetismo residual; - enfrentamos uma demanda imprevista, no início deste ano letivo, de mais cem mil alunos na rede pública estadual; - estamos admitindo mais 2,5 mil professores, aprovados em concurso realizado pelo governo anterior; - estamos reiniciando 300 obras em prédios da rede pública, que estavam paralizadas. Na área de Saúde: - estamos dando total prioridade ao Programa de Saúde da Família, em torno do qual gravitarão quase todos os programas setoriais. Esse programa, que já existe em forma embrionária, estará sendo quadruplicado de 400 para 1600 equipes, com capacidade para atender cerca de 1000 famílias cada uma, com resolutividade superior a 90%, desafogando os postos de saúde, os hospitais, e reduzindo fortemente as internações. - Estamos providenciando convênios para formação de pessoal qualificado para atuar nessas equipes multidisciplinares, formadas por médicos, dentistas, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e agentes comunitários; - começamos a regularizar as contas com fornecedores e hospitais e pretendemos investir na qualificação da rede hospitalar interiorana, articulando-a em níveis de complexidade, para aumentar a resolutividade e reduzir a ambulancioterapia, - estamos formando parcerias ? e a Federasul está sendo convidada a integrá-los - com vistas à implantação do importantíssimo projeto Começo melhor para todos, voltado ao desenvolvimento integral das crianças entre 0 e 3 anos (fase em que muitas das potencialidades humanas se desenvolvem ou não), que contará com a participação da Pastoral da Criança. - nosso governo fará tudo que estiver ao seu alcance para, nos próximos quatro anos, produzir uma substancial redução nos índices de hospitalização e reduzir a mortalidade infantil para um número abaixo de dois dígitos. Este é um desafio que o governo toma para si e para o qual convoca toda a sociedade. A mortalidade infantil que pode ser evitada é uma coisa inaceitável! Para atingir esses objetivos, dar seqüência ao que estamos fazendo, e realizar muitos outros projetos que não poderão ser iniciados neste exercício financeiro, seria insuficiente uma política que se resumisse à pacificação do estado e ao corte de despesas. Por isso, há uma terceira e importantíssima frente de ação para o governo. Ela é tão decisiva que a iniciamos ainda antes da posse, quando viajei ao exterior para fazer contatos com investidores. Trata-se de atrair investimentos, buscar recursos para o Rio Grande, manter os investimentos que temos e torna-los cada vez mais reprodutivos. Nosso estado reúne, para isso, condições muito favoráveis: - 10,2 milhões de habitantes; - 11 500 estabelecimentos de ensino; - 2,2 milhões de alunos numa população de 10 milhões; - 100 mil alunos em 424 escolas técnicas profissionalizantes; - 764 cursos de ensino superior; - PIB 31 bilhões de dólares; - maior Índice de Desenvolvimento Humano do país e a maior expectativa de vida; - 13mil km de estradas; 15 aeroportos; 9 portos; - não tivemos racionamento de energia; temos água em abundância e até 2008 estaremos exportando energia; - somos o maior produtor de grãos do país; - nossa indústria de transformação é a 2ª do país; - somos o 2º maior pólo comercial do país. - 48% do nosso PIB está no setor serviços; 40% na indústria e 12% na agropecuária; - nossa balança comercial gerou, em 2002, um superávit de 3 bilhões de dólares. O exercício do governo neste curto período de setenta dias, evidenciou, para mim, que nosso estado, com essas características, atrai o interesse de investidores nacionais e internacionais. Em pouco mais de dois meses mantivemos reuniões, em Porto Alegre: - com o BID (representante no Brasil e gerente de operações), - com diretores do Banco Mundial , - com a ministra pelo Desenvolvimento Sustentável da França, - com a ministra de Relações Internacionais da Província de Quebec, - com o ministro de Energia e Desenvolvimento Sustentável da Bélgica. Estivemos, também, com embaixadores, cônsules-gerais e delegações de inúmeros países, com outros seis governadores e com 16 ministros do governo federal. Estamos mantendo entendimentos com empresários do Brasil e do exterior para atrair vultosos investimentos: EMPRESA INVESTIMENTO EM US$ MILHÕES - Klabin, papel e celulose, 450 - Steag (Alemanha)/Copelmi (Brasil), energia 800 - Gamesa (Espanha), energia 530 - Elecnor/Enerfin (Espanha), energia 150 - CTSul (Brasil), energia 300 EMPRESA INVESTIMENTO EM RS$ MILHÕES - Souza Cruz (Brasil), tabaco 200 - Cervejaria Convenção (Brasil) 100 - Cervejaria Colônia (Brasil) 20 - Unigel ? Pólo (Brasil), química 120 - Pernod Ricard (França), bebidas 100 - Cervejaria Shincariol (Brasil) 150 Fomos à Argentina, onde novos contatos também sinalizam a possibilidade de atração de importantes investimentos. Além dos convênios para o gasoduto, estamos em entendimentos com: EMPRESA INVESTIMENTO EM US$ MILHÕES - o grupo Techint, aços planos US$ 200 - a Petroquímica Bermudez, soda e cloro US$ 15 - a Latinoamericana Aviación/Aeromot, aviões agrícolas 10 São alentadoras as visitas que tenho recebido de empresários dispostos a investir no Rio Grande do Sul, em vários setores produtivos. A lista de contatos dos últimos dias seria exaustiva para este momento, mas estamos empenhados nessa tarefa. Depositamos grande esperança nos trabalhos do CEITEC (Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada), com o intuito de transformar o Rio Grande do Sul num pólo de referência em microeletrônica. Nessa área, o Brasil mantém um déficit de balança comercial da ordem de 6 bilhões de dólares, o que dá uma idéia do tamanho desse mercado. Todo nosso empenho em atrair investimentos tem seu foco posto na geração de empregos, salário e renda para as famílias rio-grandenses. A prosperidade nos permitirá resgatar a dívida social, superar os desequilíbrios regionais, articular políticas sociais. É bem sintomático que a Região Metropolitana de Porto Alegre, certamente a porção mais desenvolvida do estado, concentre o maior índice de pessoas desempregadas e os maiores cinturões de miséria. Como explica-lo senão pelos fluxos demográficos determinados pelos desequilíbrios regionais? O governo tem isso muito presente ao formular suas estratégias. Cabe-lhe ser parceiro, induzir o desenvolvimento, colaborar com o Terceiro Setor, com o voluntariado e com uma ampla rede de entidades que muitas vezes, de modo anônimo, realizam ações sociais que deveriam ser cumpridas pelo estado. Senhores, senhoras. Nosso governo atribui, já se vê, um imenso valor à atividade daqueles que organizam os fatores de produção. Houve uma época em que governar era abrir estradas. Hoje, essas estradas adquirem um novo significado: são as estradas da tecnologia, dos mercados, da infra-estrutura, dos investimentos multilaterais e das reformas estruturais. Com efeito, o estado-empreendedor não tem mais sentido. Essa tarefa é dos homens e das mulheres de negócios. O governo deve favorecê-la e nós estamos fazendo isso de várias maneiras, inclusive proporcionando condições para que nossos empresários participem de feiras nacionais e internacionais. Por outro lado, para favorecer políticas de desenvolvimento, precisamos reformar o estado brasileiro. Nosso grande Drummond dizia que no meio do caminho há uma pedra. Olhando bem, daqui de onde estou, eu conto quatro pedras, a serem removidas por necessárias reformas estruturais: - reforma trabalhista (para que o ato de empregar não seja uma das mais difíceis e, muitas vezes, temerária decisão do empreendedor); - reforma previdenciária; - reforma política; - reforma tributária; - O descontrole das contas públicas faz com que não apenas mais de um terço do PIB vá para o estado em seus três níveis. Talvez mais grave do que isso, faz com que ele fique com a maior parte do crédito disponível. E os juros sobem para que se torne atraente seu financiamento ou refinanciamento. - O calvário do setor produtivo brasileiro tem essas duas flagelações: carga tributária elevada e taxa de juros excessiva. Senhores, senhoras. Uma economia forte e estável precisa de empresas de todos os portes: micro, pequenas, médias e grandes. E que todas cresçam e prosperem. Gerem lucros! Paguem dividendos. Reinvistam esse lucro. Gerem empregos, muitos empregos para nossas famílias e nossos jovens que chegam ao mercado de trabalho. Não temos preconceitos contra ninguém, por ser grande demais ou pequeno demais, por ser daqui ou por ser de fora. Se a saída está no trabalho, nosso governo quer ser parceiro de todos aqueles que o geram, em qualquer setor da economia. Não há portas fechadas, no governo, para os homens e mulheres de boa vontade que queiram organizar nossos fatores de produção. Façamos do Rio Grande um estado que trabalha unido. Mantenhamo-nos assim, unidos e trabalhando. Aliás, disse alguém que perseverança é o trabalho que a gente faz quando se está fatigado do trabalho que se fez. Pretendi, com esta exposição, falar-lhes sobre o que sinto, penso e estou fazendo. Manifestar-lhes o meu entusiasmo para com o futuro do Rio Grande. Para com o Rio Grande que queremos. Meu sonho, já se vê, é bem simples e exeqüível. Ele não é uma utopia. Tem lugar e tem hora para acontecer: é aqui, e é agora.